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Los Caracoles de Barcelona

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Mensagem por DeniseTeixeiradeOliveira Sex 6 Jan - 10:52


Depois de decorar o mapa da cidade e saber como chegar até a faculdade (e sobretudo sair dela), eu tinha que encontrar um lugar legal para assistir ao jogo da quarta-feira.

Quatro dias passeando a pé, de bonde e de metrô e comecei a achar estranho não ter visto nas ruas nenhuma menção a futebol. Nenhuma propaganda em café, bar ou restaurante. Nem gente falando, ou lendo os resultados nos jornais. Nem o porteiro do hotel sabia dizer onde se poderia assistir a um jogo de futebol!

Eu sabia que o pessoal da faculdade se reunia na residência estudantil, mas a dos doutorantes era tão longe e tão calma que sinceramente não dava nem vontade… parece que o pessoal lá vai mesmo pra estudar.

Finalmente, perguntei ao dono de uma bodega: - O senhor sabe onde eu posso assistir ao jogo de hoje à noite? Pergunta cretina, resposta…: - Jogo se assiste no estádio, senhorita. Tem jogo, hoje? Não, acho que não. Aquele já era o décimo bar, então ousei o que para mim pareceu inevitável: - Mas em plena Copa do Mundo tem jogo todo dia! Ele riu. Eu ri. Ficou por isso mesmo. E eu sem saber.

No começo da tarde me encontraria com Manu e Jocelyne para passear e fazer o resto da programação da semana. Estava contando com ela para descolar o tal lugar pro jogo, já que ela conhecia a cidade há mais tempo e certamente encontraria a solução. Não poderia contar com Manu pois ele, já conta com Jocelyne até pra encontrar as próprias cuecas.

Deliciosamente perdidos pelo bairro gótico naquela tarde, onde bares e restaurantes não faltam, entendi rapidinho que se ali não encontrássemos onde assistir ao jogo, pelo menos o passeio do dia estaria garantido. Que lugar interessante!

Nessa hora, eu não me lembro que horas eram pois já tínhamos tomados umas ali e acolá em busca do tal bar que transmitiria o jogo, nos deparamos com uma portinha e uma plaquinha indicando o nome do restaurante Los Caracoles.

É um dos mais falados restaurantes de Barcelona, reputado incontornável, etc etc… Lendo as boas indicações do guia, tínhamos combinado que seria ali o jantar para coroar nossa estada, o que se daria no fim da semana seguinte, pois pensávamos que roupas adequadas e coisa e tal nos seriam exigidas.

Que nada ! Mudamos os planos rapidinho, e foi finalmente ali que essa estória "gastronômica" começou, e nesse dia mesmo.

Diante daquela portinhola, por um instante pensei que nos enganamos de endereço. Eu esperava mais do Caracoles, ou pelo menos, algo maior. Íamos descobrir posteriormente que acertamos o restaurante, e que ele é enorme lá pra dentro, lá pra cima e lá pra baixo, disse-nos o garçon, na entrada.

O que erramos na verdade foi a porta, pois aquela era uma entrada lateral para os que, não querendo jantar com todos os serviços postos à mesa, tomam apenas um chopp e petiscam, ou para aqueles que, sendo pessoas muito famosas que frequentam o local, precisam se esconder da tietagem que ronda a porta da entrada principal.

Dois balcões imensos formam o bar, um de cada lado. Os famosos presuntos pendurados em toda parte. Uma atmosfera muito calma apesar de ser um bar. Um só garçon no balcão da esquerda que nos cumprimenta em francês.

[img]Los Caracoles de Barcelona Jambon12[/img]

Estranhando aquilo, começamos a rir e logo Jocelyne pergunta: - Mas porque você nos cumprimenta em francês? Ao que se engrenou o diálogo: - Vocês não vêm da França? - Sim, mas, como você sabe? - É que eu me divirto a adivinhar de onde vêm as pessoas que entram pela porta errada do restaurante, e eu as cumprimento na língua que eu imagino seja a delas. Na maioria das vezes eu acerto.


Eu, com a impertinência que me é peculiar, fui logo dizendo: - Então o senhor se enganou conosco, mesmo vindos da França, só um de nós é francês. – Ah, bom? E qual?, responde ele, fingindo-se admirado. – Então sentem-se e me dêem dois minutos que vou advinhar de onde vocês são.

Naquele momento eu ainda não sabia, mas daquela armadilha só sairíamos depois da meia-noite, e isso já bem pra lá de Bagdad.

A brincadeira começou com uma rodada de chopp. Ele serviu o mesmo para Jocelyne e eu, e um diferente para Manu, a quem ele chamou a partir daí de mon seigneur. Hoje, revendo os fatos, eu me pergunto quem era o senhor de quem ali.

Ele nos contou que vinha da região de Champagne e que morava em Barcelona há uns dez anos e trá-lá-lá. Conversa vai, conversa vem, perguntei se ali se poderia assistir aos jogos da Copa. Ele tirou de debaixo do balcão a lista das chaves com os jogos e viu quais países se disputavam naquela noite. Levantou os olhos na minha direção e disse: - 'Voilà', você é brasileira, um ponto pra mim. Você vai ter que tomar outra caneca de chopp. Toma esse aqui! Vermelho, muito bom. Eu disse: - Parabéns! Muito engraçado. Mas agora me diz, você sabe ou não de um lugar onde a gente possa assistir ao jogo? Faz horas que estamos procurando. Ele respondeu que sabia mas que só nos diria quando o jogo estivesse próximo de começar. Esperando, devíamos brindar à vida. E eu já imaginando o preço que esse tim-tim nos custaria…

Entendendo que não poderíamos nos sair daquela situação assim tão facilmente, decidimos de comum acordo deixar de lado essa estória de ver o jogo para aproveitar a brincadeira. Lá pelas quantas ele disse, apontando pra Manu: - Você, com essa cara e esse cabelo, chamando-se Manuel…, eu queria dizer que você é português, mas você fala francês sem nenhum sotaque… Difícil… E nesse caso, se você é português, ela seria a única francesa do grupo… mas ela não tem cara de francesa…Difícil..., disse apontando pra Jocelyne.

Isso nos rendeu horas de risadas. Até que entram pela tal porta dois homens. O garçon os cumprimenta em espanhol. Os dois respondem alegres. Atrás dele uma mulher, com cara de…, enfim, o Caracoles fica perto do porto, não era nenhuma surpresa se deparar com todo tipo de gente, além do mais… estávamos em Barcelona. O garçon chama a tal moça pelo nome e a cumprimenta em catalão, pergunta pela amiga, co-locatária. Ela responde que estava tudo bem agora. Eles entram e vão se instalar no primeiro andar para jantar.

Mais tarde entram três moças muito bonitas, certamente turistas, todas falando inglês. Uma canadense, a outra russa e a terceira não tivemos tempo de saber, pois elas foram embora tão logo entenderam a brincadeira do garçon, e talvez porque provavelmente achavam que passear era mais interessante que ficar bebendo chopp e conversando potoca num bar. Uma pagou seu chopp com umas moedas que eu mesma tive que contar, porque ela sozinha não conseguia, e as outras duas se foram sem pagar. E ficou por isso mesmo. E eu esperando que o garçon reclamasse. Ele com ar de que tudo era normal e engraçado.

E mais conversa fora. A campainha da cozinha toca e o garçom vai buscar os pratos que tínhamos pedido. Ele volta com grandes olhos e começa a se desculpar: - Eu não vi a hora passar, o jogo começou e eu esqueci de avisar vocês. É aqui do lado, no bar Irlandês, o único lugar que tem telão. É pertinho, vocês vão chegar logo. Eu cancelo a cozinha.

Diante daquela situação, o avançado da hora e a comida lá cheirando bem, decidimos que íamos dar uma olhada rápida no placar e voltaríamos para comer. Assim foi feito. Fomos num pé e voltamos no outro. Comemos e decidimos que voltaríamos no Irlandês somente para assistir ao segundo tempo do jogo.

O tempo passou, o papo continuou, degringolou mesmo, e nada de sairmos dali. Um famoso jogador de basquete americano entrou pela famosa porta lateral. Famoso porque me disseram, eu nunca o tinha visto mais gordo. Enfim, o segurança dele entrou primeiro. Ele depois. Manu reconheceu o sujeito e todo mundo estava de acordo que eram norte-americanos. Nessa altura nós estavamos também participando da advinhação das nacionalidades dos entrantes.

Quando todo mundo já estava embalado, eu ainda tive coragem de ir mais vezes no Irlandês espiar o placar. Uma bem rápida, a segunda mais lenta. Ao voltar pela segunda vez, me deparei com Manu sem camisa mostrando ao garçon a tatuagem de um Nintendo que ele mandou fazer na barriga. Contou-nos a estória bizarra da tal tatuagem, o que fez todo mundo chorar de rir por uns trinta minutos.

Depois, o garçon ficou se fazendo de difícil, com meias palavras, e foi então que eu percebi que ao ir ver o placar do jogo, eu tinha perdido o episódio no qual ele lançou à Manu o desafio de quem teria a tatuagem mais bizarra de Barcelona, e agora seria a vez dele de mostrar a sua tatuagem.

Ainda desconversando, ele nos contou a estória dos presuntos pendurados e dos respectivos clientes que os compram. Quase 600€ por um pedaço de carne daquele, e todos são vendidos em uma ou duas semanas. Impressionante. Ainda mudando de assunto, o garçon me diz: - Eita, vai là, parece que o teu time acabou de fazer outro gol.


E lá fui eu, lenta como um escargot. Ao fazer o trajeto até o Irlandês pela terceira vez e desta vez sozinha, já não ia com tanta convicção patriótica, entendia que já não precisava mais dela, pois o Brasil já tinha feito três gols sobre a Costa do Marfim. Não havia o que temer naquela noite; típica filosofia de torcedor convicto depois de tomar umas...

Voltando ao Caracoles a estória da tatuagem tinha evoluído. Cheguei na hora em que o garçon colava sua camisa contra suas costas nos deixando ver uma imensa tatuagem de uma garrafa de Jack Daniel’s.

Isso rendeu horas de risadas e em comemoração à tatuagem mais bizarra de Barcelona, tomamos a nona caneca de chopp. Foi então que eu precisei ir fazer algo que ninguém poderia fazer no meu lugar levando Jocelyne comigo, porque mulher é assim mesmo.

Quando voltamos do banheiro, Manu nos esperava na porta de saída. Adeus ao garçon, e nos dirigimos ao Irlandês. Eu perguntei: - E a conta? Manu: - Eu paguei, precisamos acertar. Vocês me pagam duas rodadas no bar Irlandês. Qualquer álcool bizarro que encontrarmos por lá. - Tá bom, mas vai ser muito álcool pra fazer o equivalente, não? - Que nada, o garçon só nos cobrou um chopp por pessoa, disse que era o trabalho que dava pra lavar os três copos. Também nos ofereceu o licor digestivo. Acho que um dia ele vai levar o patrão à falência…

A noite seguiu no tal Irlandês, com outras pessoas e outros males à beber, mas essa é uma outra estória. O Brasil ganhou aquele jogo, mesmo não tendo ido muito longe naquela Copa.

Hoje lembrei do Los Caracoles. Espero que não entre em falência, pois em breve voltarei na faculdade de Barcelona para atualização da bibliografia da minha tese.

[img]Los Caracoles de Barcelona Escarg13[/img]


Última edição por DeniseTeixeiradeOliveira em Qui 2 Fev - 21:20, editado 3 vez(es)
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Los Caracoles de Barcelona Empty Quase sinto o cheiro que vem da cozinha...

Mensagem por DeniseTeixeiradeOliveira Qui 19 Jan - 21:40

A visitar e revisitar:



www.loscaracoles.es


Última edição por DeniseTeixeiradeOliveira em Qui 2 Fev - 6:07, editado 1 vez(es)
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